Para Letícia Protásio(foto), “os dias passam devagar”. “Sobra tempo para ver as coisas do bebê”. Sobra tempo porque a jovem de 20 anos não está estudando, tampouco trabalha, e muito menos procura emprego (“Quem vai empregar uma grávida?”). Ela é um dos 5,3 milhões de jovens, entre 18 e 25 anos, que estão fora da educação formal e do mercado de trabalho — quase a população da Dinamarca. Um problema que atinge um em cada cinco jovens (ou 19,5% dos 27,3 milhões de pessoas dessa faixa etária), aponta o estudo exclusivo “Juventude, desigualdades e o futuro do Rio de Janeiro”, coordenado pelo professor Adalberto Cardoso, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (Iesp), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Ele teve por base microdados do Censo Demográfico de 2010, do IBGE.
As razões que levaram Letícia a interromper os estudos e largar o emprego passam pela maternidade — um dos principais motivos para as mulheres abandonarem os estudos e adiarem a entrada no mercado de trabalho. Pelos dados do especialista do Iesp, o número de moças que fica em casa é quase o dobro do dos rapazes: respectivamente, 3,5 milhões e 1,8 milhão.
— Esses jovens que ficam fora têm qualificação muito ruim. Tão ruim que, ao abandonarem a escola, o mercado de trabalho, mesmo em plena atividade, não os absorve. Resultado: eles desistem, e são os pobres os mais afetados — disse Cardoso. Na parcela mais pobre da população brasileira, com renda per capita de até R$ 77,75, quase metade (ou 46,2%) dos jovens estava fora da escola e do mercado de trabalho.
— A escola não consegue atrair o jovem, levando a uma elevada evasão escolar. Em consequência, ingressar no mercado de trabalho vai ficando mais e mais difícil — explicou Cardoso.
O gargalo, segundo o professor Fernando de Holanda Filho, da Fundação Getulio Vargas (FGV), está na baixa taxa de matrícula do ensino médio. Hoje, segundo ele, ao menos 50% dos jovens trabalham sem ter nível médio:
— Quando vão para o mercado de trabalho, não conseguem se colocar.
Nas regiões Norte e Nordeste, 25% dos jovens estão parados
Se a parcela de jovens fora da escola e do trabalho cresce nas famílias de mais baixa renda, a inatividade também é maior nas regiões Norte e Nordeste, onde 25,2% e 25,1%, respectivamente, dos jovens não estudam nem trabalham, aponta o estudo do Iesp-Uerj. No Maranhão, essa parcela é de 29,2%, a maior do país. Na outra ponta, em Santa Catarina, são 10,7%.
Em Recife, nos bairros populares, é comum encontrar jovens longe da escola e sem trabalho. Como os irmãos Juliana, de 24 anos, e Rafael Gomes da Silva, de 20 anos.
Rafael não passou nem um ano na escola, não sabe ler e aprendeu recentemente com Juliana a assinar o nome.— Não sei se vou tentar vestibular, nem cursinho estou fazendo.
Juliana fez um curso de informática, mas não se adaptou. Desde então, ela não faz nada. A família é sustentada pelo pai, que é areeiro (tira areia do leito do Rio Capibaribe para vender a armazéns de construção).
Rafael deixou a escola quando seus vizinhos saíram. Tinham entre 9 e 12 anos. Aos 16, ele tentou um programa de alfabetização para jovens e adultos, mas em menos de um mês desistiu.
O Globo
Postado por Cid Cordeiro