O ex-executivo da OAS, Léo Pinheiro, reafirmou as acusações que fez contra o ex-presidente Luiz Inácio da Silva e disse que não foi coagido a mudar suas declarações para conseguir um acordo de delação premiada com a Lava Jato.
As declarações foram feitas em carta enviada ao jornal Folha de S.Paulo, divulgada nesta quinta-feira (4).
Esta é a primeira vez que Pinheiro fala à imprensa desde que foi preso, em 2016. Pinheiro foi uma das principais testemunhas do processo do triplex do Guarujá (SP), que levou à prisão do ex-presidente. Segundo o ex-executivo, suas declarações foram endossadas por provas.
“Afirmo categoricamente que nunca mudei ou criei versão, e nunca fui ameaçado ou pressionado pela Polícia Federal ou Ministério Público Federal”, diz.
Pinheiro diz que conseguiu o acordo de delação antes de ser preso, dizendo que não sofreu pressão das autoridades. Para ele, delatar Lula foi uma “forma de passar a limpo erros”. O ex-executivo disse ainda que seu compromisso com a verdade é “irrestrito e total”.
“Não sou mentiroso nem vítima de coação alguma”, afirma. “A credibilidade do meu relato deve ser avaliada no contexto de testemunhos e documentos.”
Apartamento era de Lula
Na carta, o ex-executivo nega a mudança de versões: “A primeira vez que fui ouvido por uma autoridade sobre o caso denominado como tríplex foi no dia 20 de abril de 2017, perante o juiz federal Sergio Moro”.
Na mensagem enviada em papel ao jornal, Léo Pinheiro assegurou que “o apartamento nunca tinha sido colocado à venda porque o ex-presidente Lula era seu real proprietário”, relembrando o que afirmou a Moro no depoimento.
Em seguida, reforçou que as benfeitorias no imóvel seguiram as ordens de Lula e familiares. “Preciso dizer que as reformas não foram um presente”, disse.
Léo Pinheiro ainda repetiu as acusações que fez ao ex-presidente nos processos judiciais, detalhou as idas ao tríplex e ao sítio junto com Lula e garantiu que os depoimentos dados ao Poder Judiciário foram feitos “de maneira espontânea e voluntária, sem qualquer benefício prévio pactuado, onde, inclusive, abri mão de meu direito constitucional ao silêncio”.
Vazamento de mensagens
Em algumas mensagens, procuradores se mostraram desconfiados a respeito do empreiteiro. Segundo a Folha, as mensagens indicam que Léo Pinheiro só passou a ser considerado merecedor de crédito após mudar diversas vezes sua versão sobre o apartamento de Guarujá que a empresa afirmou ter reformado para o líder petista.
Pinheiro teria mudado sua versão de depoimento duas vezes até que, em 2017, afirmou que o triplex seria de Lula. O ex-executivo disse que as obras no apartamento e no sítio de Atibaia eram financiadas pela OAS e descontada de propina ao PT.
Defesa de Lula
Em nota, a defesa do ex-presidente Lula, afirma que carta encaminhada por Léo Pinheiro ao jornal Folha de S. Paulo, no dia 4 de julho, é incompatível com os diálogos de procuradores da Lava Jato divulgados pelo próprio jornal e pelo “The Intercept” e em momento algum abala o que sempre foi demonstrado pela defesa do ex-presidente.
A defesa reafirma que na prisão, Pinheiro fabricou uma versão para incriminar Lula em troca de benefícios negociados com procuradores. “A pressão sobre Léo Pinheiro para incriminar Lula, tal como revelado pelos citados diálogos, é compatível com os acontecimentos da época”.
Confira a íntegra da carta:
“Estou preso há três anos e sete meses, por ter praticado crimes que fui responsável. Chegou o momento de falar um pouco sobre o noticiário a meu respeito.
A matéria, publicada nesta Folha de S.Paulo, sob o título ‘Lava a Jato via com descrédito empreiteiro que acusou Lula’, no último domingo, dia 30 de junho de 2019, necessita de alguns esclarecimentos, todos eles amparados em provas e fatos.
A minha opção pela colaboração premiada se deu em meados de 2016, quando estava em liberdade, e não preso pela Operação Lava Jato. Assim, não optei pela delação por pressão das autoridades, mas sim como uma forma de passar a limpo erros que cometi ao longo da minha vida. Também afirmo categoricamente que nunca mudei ou criei versão e nunca fui ameaçado ou pressionado pela Polícia Federal – PF ou Ministério Público Federal – MPF.
A primeira vez que fui ouvido por uma autoridade sobre o caso denominado como ‘tríplex’ foi no dia 20 de abril de 2017, perante o juiz federal Sérgio Moro, durante meu interrogatório prestado na ação penal referente ao tema.
Na oportunidade, esclareci que o apartamento nunca tinha sido colocado à venda porque o ex-presidente Lula era o seu real proprietário e as reformas executadas foram realizadas seguindo suas orientações e de seus familiares. O ex-presidente e sua família foram ao tríplex e solicitaram reformas como a construção de um quarto, mudanças na área da piscina etc. Tudo devidamente testemunhado por funcionários da empresa que acompanharam a visita e prestaram testemunhos sobre isso.
Afirmei ainda que os valores gastos pela OAS foram devidamente contabilizados e descontados da propina devida pela empresa ao Partido dos Trabalhadores em obras da Petrobras, tudo com anuência do seu maior líder partidário. A conta corrente com o PT chegou a aproximadamente R$ 80 milhões, por isso havia um obrigatório encontro de contas com o sr. João Vaccari Neto.
O meu interrogatório foi confirmado por provas robustas que o Poder Judiciário, em três instâncias, entendeu como material probatório consistente para condenação de todos os envolvidos.
O material que comprova a minha fala está no processo do tríplex e foi todo apreendido pela Operação Lava Jato na minha residência, na sede da empresa OAS, na residência do ex-presidente Lula, na sede do Instituto Lula e na sede do Bancoop, o que quer dizer que não há como eu, Léo Pinheiro, ter apresentado versões distintas, já que o material probatório é bem anterior à decretação da minha prisão em novembro de 2014. Além disso, plantas das reformas do tríplex, projetos deste apartamento e do sítio, bem como contratos, foram apreendidos na própria residência do ex-presidente, cabendo à minha pessoa tão somente contar a verdade do que tinha se passado. O próprio ex-presidente Lula, em seu interrogatório no mesmo caso, confirmou que voltamos no seu carro após nossa visita ao tríplex no Guarujá -SP.
As provas que estão presentes no processo são bem claras e contundentes, tais como:
Documentos que indicam o ex-presidente e sua família como proprietário do imóvel antes mesmo de a OAS assumir o empreendimento, apreendidos na residência do ex-presidente Lula e na sede da Bancoop;
Emails internos da OAS que demonstram a necessidade de ‘atenção especial’ com a cobertura 164, bem como os projetos da obra;
Registros dos meus encontros com Paulo Okamotto, João Vaccari Neto e o ex-presidente Lula, em minha agenda do celular, no Guarujá, no Instituto Lula e na residência do ex-presidente em São Bernardo do Campo;
Mensagens sobre encontro de contas com João Vaccari;
Depoimentos de pessoas que não estão vinculadas à OAS e que trabalharam nas obras da reforma, bem como de funcionários do prédio Solaris e também dos demais funcionários da empresa envolvidos na obra da cobertura.
Neste mesmo período, surgiu um novo pedido do ex-presidente Lula: uma reforma no seu sítio.
Fui ao sítio com o ex-presidente ver e ouvir os pedidos de reforma e reparos, visita que foi fotografada e testemunhada pelo diretor da empresa designado para supervisionar as obras no sítio e no tríplex. Me recordo que fui em um sábado até o apartamento do ex-presidente, em São Bernardo do Campo, mostrei os projetos do sítio e do tríplex para que fossem aprovados. Esta visita consta dos registros da minha agenda e em mensagens, além de ter sido confirmada no processo judicial pelo testemunho do diretor que me acompanhou.
Com o aval do ex-presidente Lula e seus familiares, as obras começaram. O sigilo era uma especial preocupação nos trabalhos.
As obras do sítio e no tríplex tinham custos relevantes e eram devidamente contabilizadas. Documentos internos da OAS provaram no processo que as despesas das duas obras eram lançadas em centros de custos próprios, com uma referência ao ex-presidente (‘Zeca Pagodinho’) e as divisões ‘praia’ e ‘sítio’.
Preciso dizer que as reformas não foram um presente. Os empreendimentos da Bancoop assumidos pela OAS apresentavam grandes passivos ocultos, com impostos, encargos que não deveriam ser assumidos pela OAS. Em paralelo, João Vaccari cobrava propina de cada contrato entre OAS e Petrobras. Combinei com Vaccari que todos os gastos do tríplex e sítio seriam descontados da propina. Repito, esse encontro de contas está provado por uma mensagem minha trocada na época dos fatos, devidamente juntada no processo e ainda pelo depoimento do diretor da empresa.
Tenho consciência de que minha confissão foi considerada no processo que condenou o ex-presidente Lula, assim como as minhas provas que apresentei espontaneamente. Não sou mentiroso nem vítima de coação alguma. A credibilidade do meu relato deve ser avaliada no contexto de testemunhos e documentos.
Meu compromisso com a verdade é irrestrito e total, o que fiz e faço mediante a elucidação dos fatos ilícitos que eu pratiquei ou que eu tenha tomado conhecimento é sempre respaldado com provas suficientes e firmes dos acontecimentos.
Trata-se de um caminho sem volta, iniciado em 2016 e apresentado neste caso do tríplex, bem como um diversos outros interrogatórios que prestei, como no caso do sítio de Atibaia, Silvio Pereira, Cenpes, CPMI da Petrobras e prédio Itaigara/Torre Pituba.
Os fatos por mim retratados ao Poder Judiciário foram feitos de maneira espontânea e voluntária, sem qualquer benefício prévio pactuado, onde, inclusive, abri mão do meu direito constitucional ao silêncio.
Curitiba, 02 de julho de 2019.
LÉO PINHEIRO, ex-presidente da OAS.”