Já faz alguns anos, mas dá gosto só de lembrar como era gostoso viver o São João das farturas de épocas em que fazia gosto plantar porque a colheita era certa. Pobre podia sofrer boa parte do ano com a escassez de alimento, mas quando era tempo de cortar a lenha pra ascender a fogueira todos estavam de barriga cheia.
O bom São João que recordo era vivido de forma modesta, não tinha grandes atrações tocando na praça nem bebidas pra todo gosto. A casa era de taipa e de chão batido, erguida no quintal da casa de minha saudosa vovó Adriana, na Rua Bela Vista, na antiga Araçá dos Luna Freire.
Era trabalhoso sim preparar a terra para plantar. Os enormes troncos eram removidos no braço, às vezes levavam-se dias para retirar um só. Meu pai era quem enfrentava os mais fortes “tocos”. Eu, minha mãe e meus irmãos encarávamos os troncos menores. No final do dia as bolhas nas mãos denunciavam o trabalho pesado. Mas era bom. O resultado era muito bom.
A chuva caía, a gente plantava e cuidava com muito carinho de cada pedacinho do roçado. A espera para a colheita era pouca. O feijão era verde-ligeiro. O maxixe dava por toda parte. O quiabo era facilmente colhido no aceiro do roçado. O jerimum, esse tinha de ficar maduro para comer com leite de coco. Mas o milho era o mais esperado. Era ele (o milho) quem fazia a alegria do meu São João.
Quando chegava o dia 23 todos acordavam ainda mais cedo, coisa de 3 da madrugada. Tinha de “quebrar” as espigas cedo para regressar e preparar as delícias de mais tarde. Depois de colhido o milho, cada um acomodava com uma rodilha certa quantidade de espigas e tomava a estrada.
Ao chegar, o milho era colocado no meio da cozinha e o trabalho passava a ser coordenado pelas mulheres. Dona Deda, Dona Adriana, Dona Dalvinha, Tia Lourdes e as vizinhas se encarregavam de, artesanalmente, produzir os pratos típicos da noite, esperada o ano inteiro. A tarde ia se passando e o cheio, aos poucos tomava conta da casa e do quarteirão. Em algumas horas de trabalho lá estava a mesa pronta para todos se fartarem.
Enquanto não chegava a hora de degustar a pamonha, a canjica, o bolo, o angu e outros pratos alguém tinha de preparar a fogueira. A missão sempre era cumprida pelo mais forte da casa. Meu pai fazia a fogueira e ateava fogo. A noite de São João já havia começado.
Na hora do jantar cada um comia aquilo que lhe era servido. Não podia “estruir” a comida, mesmo com a mesa cheia. Depois de fartos, íamos para o “pé da fogueira” assar milho, tomar vizinhos como compadre e esperar o sono chegar ouvindo estórias de trancoso. Pode não parecer muito divertido, mas era bom e sinto saudades do meu São João de ontem.